Há umas noites atrás sonhei. Sonhei duas vezes numa única noite. Ou melhor, sonhei uma vez durante a noite e sonhei a segunda já de manhã.
Acordei assustado com um pesadelo daqueles que nos deixam o coração aos pulos, daqueles que metem medo. Olhei para o quarto em redor e reparei num pequeno fio de luz que se esgueirava entre a portada e a parede. Estava confortavelmente quente e sentia o frio fora dos lençóis. Decidi deixar-me ficar a ver no que aquilo dava; "pode ser que volte a adormecer", pensei eu... E voltei mesmo. Mal eu sabia da reviravolta que ia acontecer.
Quando dei por mim estava na Quinta do Fojo rodeado de gente e cães, muitos cães, alguns que conhecia, outros nem tanto. Havia uma grande confusão - confusão de festa, confusão boa, feliz - e nem me lembro bem o que estava a acontecer como é típico dos sonhos. Eis quando o meu primo entre numa pequena guerrilha amistosa comigo e começa a correr atrás de mim. Depois de corridos uns quantos metros, atravesso a janela virada para a Serra e, após um pequeno empurrão com os pés, dou por mim a voar com uma suavidade e fluidez incrivelmente reais. Estava a voar, eu estava realmente a voar! Sentia o ar na cara e a brisa a percorrer-me os cabelos. Via tudo cá de cima e nada me conseguia para. Estava livre como nunca e sentia aquela felicidade que nos enche o peito ao ponto de rebentar! Só me apetecia gritar toda a alegria que me corria nas veias! Lá de baixo ainda oiço o meu primo gritar "Fogo assim não vale!" ao que eu respondo "Este sonho é tão bom! Não quero que acabe nunca!". No momento da minha resposta apercebo-me de que realmente estou a sonhar. O mais fantástico disto tudo é que obriguei toda a minha consciência a memorizar todos e quaisquer pormenores daquela situação. Sabia que aquilo ia acabar e, portanto, disse a mim mesmo: "Vou tornar isto realidade".
De repente acordei. Tão satisfeito com este sonho como assustado com o anterior. Nunca me tinha acontecido. Foi delicioso voar. Eu senti o voar. Acho que quando me apercebi que era realmente um sonho, ainda estava a sonhar e isso permitiu-me fazer um esforço maior para registar o que se passava. Senti um sonho sabendo que este ia acabar. Foi efémero mas real. Não há uma lembrança nublada do sonho, há uma recordação. Pergunto-me o seguinte: se não consigo encontrar diferenças entre a minha recordação deste sonho e a recordação da minha última viagem para Lisboa, porque é que uma delas é mais real que a outra? Não é! Eu não quero que seja, não sinto que seja, nem é! Foi um sonho real, porque o vivi!
Eu voei!